Por Flávio G. Souza
Cresceu-se muito o falso
conceito de que estudar a Bíblia excluí a teologia, mas como separar se ambos
estão intimamente interligados sinergicamente? Dizer que Teologia é o estudo sobre Deus é apenas um resumo de um tema tão complexo e profundo.
A teologia nos ajuda a
compreender diversos aspectos da Palavra e da pessoa de Deus. E diferente do que os crentes
modernos pensam, estudar teologia não esfria o crente. Os que se utilizam deste
jargão geralmente ficam falando “Ah, mas a Bíblia diz que a letra mata,
irmão cuidado com esse negócio de estudar teologia!.”. Entenda, quando
o Apóstolo Paulo escreveu que a letra mata, estava fazendo um contraste da
Antiga Aliança (Lei), com a Nova Aliança (Graça), não há nada contra o estudo teológico.
Os crentes modernos baseados
neste texto, carregados de preconceito sobre quem se dedica a aprender teologia,
cismaram em fazer da Bíblia um livro de autoajuda. Um pastor moderninho recentemente disse que temos o mesmo DNA de Jesus, provavelmente ele se baseou
no texto de Salmos 82.6, que diz:
“Vós sois
deuses, e todos vós filhos do Altíssimo.”
Como diz um ditado popular,
texto sem contexto se torna pretexto, se pegarmos este versículo isolado,
podemos tirar todo tipo de interpretação. O primeiro ponto a se considerar é,
Salmos é categorizado como um livro poético do Antigo Testamento, e como todos
nós sabemos, não se interpreta um texto poético no literal.
O salmista não disse que somos
deuses, como se fossemos iguais a Deus, um dos aspectos da Teologia do
Antigo Testamento explica este detalhe. Os governantes e juízes, representavam
Deus ao executar juízo. Jesus por exemplo se utilizou desta mesma passagem para
suas declarações de ser Deus. (Cf. Jo 10.34-36 Cp: Êx 4.16; 7.1).
Acerca da expressão: Vós sois deuses (6), eles
eram filhos do Altíssimo quanto ao poder e responsabilidade dados a eles. Paulo
descreve os magistrados humanos, no exercício da sua função, como guardadores
da paz, como “autoridades [...] ordenadas por Deus” e “ministro[s] de Deus
[...] Quem resiste à autoridade resiste à ordenação de Deus” (Rm 13.1-6). Por
causa do seu flagrante traição de confiança, esses juízes corruptos recebem a
seguinte sentença: Como homens morrereis e caireis como qualquer dos príncipes
(7). Seus cargos e posições não os salvarão da destruição. [1]
João Calvino fez a seguinte comentário
acerca deste texto: “Deus investiu os juízes com um caráter e título sacros.
Isso, o profeta admite; mas, ao mesmo tempo, ele mostra que tal coisa não
propiciará nenhum apoio e proteção aos juízes ímpios. Ele não os introduz
falando da dignidade de seu ofício; mas, antecipando o estilo de raciocínio que
se dispõem a adotar, ele replica: “Se apelais para vossa dignidade como um
argumento em vossa defesa, tal vanglória de nada vos valerá; sim, ao contrário,
estais vos enganando por vossa tola confiança; pois Deus, ao designar-vos seus
substitutos, não se despojou de sua própria soberania como supremo governante.
Além disso, ele quer vos lembrar de vossa fragilidade como um meio de
instigar-vos a executar com temor e tremor o ofício que vos foi confiado.” Este
versículo pode também ser visto como sendo dirigido por Deus mesmo aos
governantes, e como a insinuar que, além de os revestir com autoridade, ele
lhes concedeu seu nome. Esta interpretação parece concordar com a linguagem de
Cristo em João 10.34, onde ele fala dos que são chamados deuses a quem veio a
palavra de Deus. A passagem, contudo, pode ser apropriadamente elucidada assim:
Admito que sois deuses e filhos do Altíssimo.
Mas isso não altera materialmente
o significado. O objetivo é simplesmente ensinar que a dignidade com que os
juízes são investidos não pode tornar-se uma justificativa para se escaparem do
castigo que sua perversidade merece. O governo do mundo lhes foi confiado com
base no discernimento distinto de que eles mesmos também um dia terão de
comparecer perante o tribunal do céu para o acerto de contas. A dignidade,
pois, com que são revestidos é só temporariamente, e passará com a aparência do
mundo. (CALVINO, 2013)
O salmista está escrevendo contra os reis
e juízes que eram responsáveis por executar o julgamento, eles haviam se
corrompido aceitando pessoas ímpias (2), se tratando de um clamor pela má
administração das autoridades. Ou seja, ser filho de Deus não nos torna
iguais a Deus como um pastor coach disse, nem nos torna a “4ª pessoa da
trindade” como já vi em um livro de cantor “cristão”, baseado em uma nova
revelação. Entenda, somos filhos de Deus por adoção, portanto continuamos
pobres, miseráveis e dependentes da Graça de Deus. Perfeição só encontraremos na eternidade.
Esses animadores de palco, insistem em
dizer que precisa motivar as pessoas, mas qual a necessidade disso? O que custa
pregar a verdade? Infelizmente o que vale é agradar, não caia nesse
modismo, pregue a Palavra e não anestesie condenados ao inferno. Encher o ego dos ouvintes não produz salvação, e sim enganação.
Graça e paz.
Pense nisso.
Referência Bibliográfica:
[1] Comentário Beacon, Jó a Cantares, 1ª Edição, CPAD, 2006. Pág. 238.
[2] CALVINO, João. Editora Fiel, Salmos Volume 3, 1ª Ed, 2013.
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